Convidados

Racismo no Brasil

Camila Dutra Lima
Psicóloga, Graduada pela Faculdade São Francisco de Assis, Especialista em Saúde da Família e da Comunidade (Grupo Hospitalar Conceição), Pós-Graduanda em Sexualidade Humana, Psicóloga Clínica.

“Permita que eu fale, não as minhas cicatrizes
Elas são coadjuvantes, não, melhor, figurantes
Que nem devia tá aqui
Permita que eu fale, não as minhas cicatrizes
Tanta dor rouba nossa voz, sabe o que resta de nós?
Alvos passeando por aí
Permita que eu fale, não as minhas cicatrizes
Se isso é sobre vivência, me resumir à sobrevivência
É roubar o pouco de bom que vivi
Por fim, permita que eu fale, não as minhas cicatrizes
Achar que essas mazelas me definem é o pior dos crimes
É dar o troféu pro nosso algoz e fazer nóis sumir”
(Emicida, 2019)

No Brasil, o racismo é um processo político e histórico em que as condições de privilégio ou de subalternidade de sujeitos racializados são reproduzidas, orientando os processos de subjetivação, ou seja, modos de perceber, agir, interagir e pensar dos indivíduos e grupos sociais, sendo uma estrutura social (Almeida, 2018).

Ao encontro do que Almeida (2018) menciona, os indicadores sociais expressam o impacto do racismo na população brasileira, tanto no que se refere ao acesso às políticas públicas (de educação, saúde e cultura) quanto na dinâmica do mercado de trabalho, nas condições econômicas, no acesso ao poder institucional, bem como em relação aos altos índices de mortalidade (Paixão e Carvano, 2008).

O uso de imagens da mídia desempenha um papel político e que conserva a dominação racista, perpetuando representações de raça e negritude que oprimem e exploram a dominação de pessoas negras de várias formas, assim negritude é marcada como um emblema do “primitivo” e da selvageria. Esses corpos são representados maciçamente como descartáveis e sem importância (HOOKS, 2019).

Dessa forma, Almeida (2018) refere que a mídia e o Estado reproduzem as imagens das pessoas negras como inimigas, sendo estas compreendidas como perigosas e selvagens, e a forma de tratamento destas, é a eliminação, instaurando a morte como forma de organização do poder e usando como justificativa os riscos à economia e à segurança pública.

O racismo faz com que pessoas negras sejam expostas à extrema violência, banalizando-se e naturalizando a morte de crianças, adolescentes e adultos por “balas perdidas”, que têm, nos corpos negros, seus alvos, além de permitir que áreas inteiras não tenham saneamento básico, sistema educacional e de saúde e que aconteça o genocídio de milhares jovens negros por ano (Almeida, 2018).

Ao longo dos anos, os movimentos sociais negros se articularam de forma veemente em busca de melhores condições de vida e são os responsáveis por muitas das conquistas da população negra. Sendo a afirmação da negritude uma forma de resistência e combate ao racismo, objetivando a saída dos lugares estereotipados da população negra , visando à valorização dos traços, da força da negritude e da ancestralidade, como forma de superar a dor que o racismo pode causar (Vannuchi, 2017).

É urgente nós, enquanto sociedade, seguirmos e intensificarmos a discussão sobre as relações raciais, sendo fundamental esse aspecto na construção, formulação e manutenção das políticas públicas em todos os níveis, bem como o papel da educação, cultura, arte, mídia e circulação das palavras, visando à garantia de direitos e mobilização do racismo estrutural, para que tenhamos uma sociedade com menos desigualdades sociais. Fica o ensinamento de Angela Davis […] “em uma sociedade racista, não basta não ser racista, é necessário ser antirracista”. (Davis, 2017).

REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Silvio. O que é racismo estrutural?. Belo Horizonte: Letramento, 2018.
DAVIS, Angela. Mulheres, Cultura e Política. São Paulo: Boitempo, 2017.
EMICIDA. AmarElo. In: EMICIDA. Amarelo. Rio de Janeiro: Laboratório Fantasma, Sony Music. 2019. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch v=PTDgP3BDPIU&list=RDPTDgP3BDPIU&start_r adio=1 >.
HOOKS, bell. Vivendo de amor. O livro da saúde das mulheres negras: nossos passos vêm de longe, v. 2, p. 188-198, 2000.
KILOMBA, Grada. Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano. Rio de Janeiro: Cobogó, 2019.
PAIXÃO, Marcelo; CARVANO, Luiz Marcelo. (Orgs). Relatório Anual das
desigualdades raciais no Brasil; 2007-2008. Rio de Janeiro:Garamond Universitária, 2008.
VANNUCHI, Maria Beatriz Costa Carvalho A violência nossa de cada dia: o racismo à brasileira. In:Kon, Noemi Moritz; Silva, Maria Lúcia da; Abud, Cristiane Curi(org.).
O Racismo e o Negro no Brasil – questões para a Psicanálise.São Paulo:
Perspectiva, 2017.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.